As injustiças nossas de cada dia
São sete da manhã de uma quinta-feira chuvosa em João
Pessoa. A porta do elevador abre. Com vista ao horizonte do terceiro andar do
empresarial, uma jovem com um olhar perdido. Ao ouvir o bom dia, a reação de
desânimo.
No rosto, a estampa do desalento. Roupa molhada e
lágrimas nos olhos. Impossível ser indiferente a este retrato. Uma simples
pergunta:
– Você está precisando de ajuda?
A resposta veio em forma de choro incontido e desabafo:
– Fui assaltada agora.
A moça de 16 anos, moradora de Cabedelo, estagia numa
instituição no Centro de João Pessoa, graças ao programa Jovem Aprendiz.
Todos os dias, sai com o marido de casa para a Capital.
Ele segue para o trabalho e ela para o estágio. Da parada de onde desce da moto
para o trabalho leva uma caminhada.
Na de hoje, um outro jovem atravessou seu caminho. Ela
logo percebeu algo estranho. O rapaz se aproximou, tentando dissipar qualquer
medo com rápido e artificial diálogo e se apresentando como alguém inofensivo.
Depois, apontou para a cintura, mostrou uma faca e
anunciou uma sentença:
– Vai passar o celular ou quer levar uma facada?
Trêmula, Maria (codinome) entregou o seu singelo e
recém-consertado aparelho, que servia – no dizer dela – só para ligar e
receber. Quase sem voz, ainda deu tempo pedir pela vida.
O assaltante pegou o produto do seu roubo e foi embora
deixando a vítima para trás.
Nem ela sabe como, mas prosseguiu, sem sentir as pernas,
no percurso até o prédio do seu trabalho. Antes da porta principal abrir, ela
entrou na garagem. Não segurou o drama e a angústia e gritou, desalojando da
garganta o nó da angústia e sensação de impotência.
– Moço, como um ser humano faz isso com outro? Eu acordo
cedo para trabalhar e ele acorda para roubar. Isso não é justo! O que mais me
dói não é o celular, é a atitude, é o sofrimento que ele me causa. Eu estou
traumatizada.
No desabafo espontâneo a este interlocutor, Maria
confessou que não sabia como iria enfrentar o resto do seu dia. A vontade era
de ir embora pra casa e chorar.
Principalmente, porque com o roubo do celular agora ela
vai ter que escolher entre comprar outro usado para se comunicar com esposo e
mãe ou consertar a geladeira que queimou essa semana.
A primeira funcionária da instituição empregadora chega e
abre a porta para o novo dia de trabalho. Toda ensopada, da chuva e do choro, a
abalada ‘menina’ se despede de mim e entra.
Falta força e controle da emoção, mas ela precisa seguir.
Ao meio dia, terá que correr, literalmente, de volta para
Cabedelo. E desembarcará direto no colégio onde cursa o nono ano do ensino
médio, e muitas vezes por lá mesmo almoça, quando consegue. Reside lá seu sonho
de um lugar ao sol e de uma vida digna.
Maria não pode parar. Ela é do Brasil que trabalha e não
perde a esperança de um futuro melhor. Mesmo quando quase tudo no seu caminho
só lhe dá motivos para desistir.
Acompanhe
mais notícias do Canal do Povo
Entre
em contato com a gente:
Telefone:
(83) 99853 2134
WhatsApp: (83)
99853 2134
E-mail:
canaldopovopb@gmail.com